domingo, 18 de maio de 2014

PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR (CONTEÚDO E FINALIDADE)


“O PPP surge como um princípio económico que visa a internalização dos custos externos repercutindo nos custos finais dos produtos e serviços provenientes da atividade”[1].

Este Princípio surge-nos no panorama da O.C.D.E.[2], estabelecendo-se que “ o poluidor deve suportar as despesas da tomada de medidas de controlo da poluição decididas pelas autoridades públicas para assegurar que o meio-ambiente se mantenha num estado aceitável”. É, posteriormente, em 1973, reconhecido como um princípio chave de atuação comunitária ambiental, embora a sua consagração comunitária aconteça em 1986 com o Ato Único Europeu, tornando-se um princípio constitucional de direito comunitário do ambiente, previsto no artigo 174º/2 do Tratado da Comunidade Europeia[3].

Ora, também no plano nacional este princípio goza de consagração constitucional, representando um resultado do artigo 66º/2, alínea h), da CRP, que determina ter de se “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com ambiente e qualidade de vida”.

O Princípio do Poluidor-Pagador (PPP) decorre da coincidência entre o benefício retirado de uma atividade poluente e a responsabilidade sobre esse mesmo efeito poluente.

O Prof. Vasco Pereira da Silva refere que com o alargamento do conteúdo deste princípio, deve-se entender que este abarca não apenas às lesões efetuadas mas igualmente à reparação destas[4] [5].

É consensual considerar que o princípio em apreço é tanto um princípio preventivo quanto é reparatório.

Quanto à vertente preventiva, o Prof. Gomes Canotilho refere que os seus fins são prever e precaver a existência de danos ambientais e operar a redistribuição do suporte dos seus custos das medidas tomadas neste sentido.[6] Também Alexandra Aragão entende que o fim deste princípio será prevenir a poluição futura e não a correção de danos já ocorridos.

Nesta vertente, cumpre enquadrar esta atuação diferenciando-a do Princípio da prevenção, estipulado no artigo 66º/2, alínea a), CRP, que estipula ser uma função do Estado “prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão”.

Ora, para que os âmbitos de aplicação não se sobreponham, deveremos entender que estes dois pilares (prevenção e poluidor-pagador) se devem coordenar, mas não ter a mesma função. Deste modo, o princípio sob análise (PPP), deve ser visto segundo uma perspetiva reparatória[7] [8].

É de referir que, no entendimento do Prof, Vasco Pereira da Silva, este princípio comporta as medidas preventivas necessárias À diminuição destes comportamentos de risco. O Prof. aponta ainda um exemplo que considera contrário a este princípio: os preços dos combustíveis, pois entende não haver um agravamento monetário dos combustíveis mais poluentes. Ora, na opinião em que este princípio corresponde a uma vertente reparatória, o problema apresentado situar-se-á no âmbito do princípio da prevenção. 

Quanto a esta vertente reparatória, António Barreto Archer, entende não haver qualquer dimensão preventiva, sendo o que se exige do poluidor é a obrigação da correção da sua ação que degradou o ambiente, suportando esses encargos e os que advenham da extinção da atividade poluente em causa[9].

A finalidade principal deste princípio será assim, a reação ao dano provocador pelo sujeito, aplicando-se quando exista uma verdadeira lesão ao ambiente e não uma previsão de que tal poderá ocorrer (neste último caso, estaríamos já no âmbito da prevenção). Pretende-se evitar que o dano sofrido fique sem reparação, imputando-a ao operador poluidor. Não devemos entender haver uma permissão para poluir mas, havendo uma frustração da prevenção, possuir uma garantia da sua reparação.

Este princípio é a motivação da criação do regime da responsabilidade ambiental (RJRDA).

Com este regime, o PPP deixa de ser apenas um critério de aferição da validade de atos jurídicos, e aparece num sistema completo que estabelece as consequências deste princípio basilar e em que medida, ou seja, estabelece o pagamento pelos poluidores.

Ora, este regime pretende responsabilizar o poluidor, ficando as medidas preventivas (quem assim entende) e reparadoras na incumbência do operador, apesar de, por vezes não ser clara a identificação do operador responsável ou este poder não as tomar.

Assim, a autoridade competente fica delegada para segundo plano, como um último recurso, quando não puder ser identificado ou esteja isento de o fazer (artigos 19º e 20º do RJRDA), tendo em conta que nesta situação seriam suportadas pelo Fundo de Intervenção Ambiental (artigo 23º). Isto não acorre pois a portaria necessária para regular este fundo está omissa no nosso ordenamento jurídico.

Encontramos assim uma preferência pela atuação do próprio operador que Alexandra Aragão[10] justifica com razões de equidade, ou seja, fazer o poluidor suportar diretamente os custos das medidas a serem tomadas. Verifica-se, então, uma “filosofia de internalização de custos que acaba por corresponder ao regime mais justo e também, a maior parte das vezes, ao regime mais eficaz do ponto de vista ambiental”.

 

BIBLIOGRAFIA:

VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2002

ALEXANDRA ARAGÃO, O Princípio do Poluidor Pagador como Princípio Nuclear da Responsabilidade Ambiental no Direito Europeu,

ANTÓNIO BARRETO ARCHER, Direito do Ambiente e Responsabilidade Civil, Almedina, 2009

TERESA MARGARIDA NOBRE FERNANDES, Princípio do Poluidor-Pagador, Doutoramento em Ciências Jurídico-civis, Lisboa, Junho de 2010

 

Rita João Soares Freire

Nº 18382



[1] TERESA MARGARIDA NOBRE FERNANDES, Princípio do Poluidor-Pagador, Doutoramento em Ciências Jurídico-civis, Lisboa, Junho de 2010, pp. 26
[2] Recomendação C (72)128 da O.C.D.E., de 26 de Maio de 1972
[3] Vide Decisão nº 1600/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Junho de 2002
[4] VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2002, pp. 75
[5] Na visão do Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA, incluirá também as medidas de prevenção necessárias para impedir ou minimizar a imitação destes comportamentos de risco (através de taxas, benefícios fiscais, impostos, ect.)
[6] É então possível falar de uma responsabilidade do futuro (diz Catherine Thibierge ou de um enriquecimento sem causa do poluidor (refere Jean Duren) – Vide ALEXANDRA ARAGÃO, O Princípio do Poluidor Pagador como Princípio Nuclear da Responsabilidade Ambiental no Direito Europeu, pp. 107
[7] Seguindo o entendimento de TERESA MARGARIDA NOBRE FERNANDES, Princípio do Poluidor-Pagador, Doutoramento em Ciências Jurídico-civis, Lisboa, Junho de 2010, pp. 9
[8] Diferentemente, VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2002, pp. 75
[9] António Barreto Archer, Direito do Ambiente e Responsabilidade Civil, Almedina, 2009
[10] ALEXANDRA ARAGÃO, O Princípio do Poluidor Pagador como Princípio Nuclear da Responsabilidade Ambiental no Direito Europeu, pp. 101

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