quinta-feira, 15 de maio de 2014



Verde agir da União Europeia: o rótulo ecológico

 
Nos dias de hoje estamos perante uma Administração Pública Agressiva, consequência deste fenómeno é a crise do acto administrativo, como tal o acto administrativo deixa de ser a única forma de actuação da Administração, mas sim «uma» perante as demais. O Direito do Ambiente «é o laboratório» que vai servir de base para a «experimentação» das novas formas de actuação administrativa, como refere o Senhor Professor Vasco Pereira da Silva.
Exemplo claro do que foi exposto é o caso do rótulo ecológico ou da eco-etiqueta. Este instituto foi criado pelo Regulamento do Conselho n.º 880/92/CEE, de 23 de Março de 1992, mas actualmente encontra-se regulado no Regulamento (CE) n.º 66/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Novembro de 2009.
Do ponto de vista das formas de actuação administrativa, o rótulo ecológico consiste na combinação de um acto administrativo, de um contrato e de uma multiplicidade de actuações administrativas informais: em primeiro lugar a relação jurídica inicia-se com um acto administrativo (atribuição do rótulo ecológico) após o pedido realizado pelo fabricante, de seguida celebrar-se-á um contrato entre o particular que vai estabelecer as condições de utilização do rótulo. Finalmente existe um conjunto de actuações administrativas informais que vão perdurar no tempo, cujo objectivo é intervir sobre o mercado de produção e de consumo de bens, promovendo desta forma o rótulo ecológico quer através de campanhas de sensibilização, assim como de informações prestadas junto dos consumidores, produtores, comerciantes, entre outros entes relevantes. Como refere SANZ RUBIALES quando falamos em rótulo ecológico falamos no «cruzamento das políticas industrial, de defesa dos consumidores e do meio-ambiente», demonstrando claramente o carácter multidisciplinar deste instituto.
Como refere FRANÇOIS OST «a sorte das gerações futuras é directamente afectada pelo comportamento das gerações presentes», o que quer dizer que os irreversíveis danos cometidos contra os recursos naturais assim como a destruição de ecossistemas afectam a vida humana de uma forma definitiva. Como tal, tem existido ao longo dos últimos anos um esforço por parte do Direito em dar resposta aos problemas que têm surgido contra o meio Ambiente, estimulando práticas ambientalmente sustentáveis. O rótulo ecológico é uma resposta face à actual sociedade industrializada em que vivemos, preocupando-se com o desempenho ambiental dos produtos, tentando evitar desta forma os danos ecológicos. O seu surgimento também se prende pela necessidade de proteger o consumidor dos excessivos rótulos «auto-proclamados», conseguindo orientar o consumidor nas suas compras, para que desta forma sejam conscientes e ecologicamente responsáveis, alcançando assim um desenvolvimento sustentável.
Alguns estudos demonstram que no momento de decisão de compra, o consumidor tem privilegiado os produtos que têm um melhor desempenho ambiental, designados como produtos «amigos» do Ambiente. O facto de existir procura de produtos ecológicos vai gerar na esfera das empresas um estímulo para que estas repensem as suas escolhas e reforcem os seus esforços no domínio do ambiente. Contudo, para que os consumidores possam fazer escolhas menos prejudiciais para o ambiente é fulcral que tenham um fácil acesso às informações relevantes sobre a qualidade ambiental dos seus produtos.
Como tal, para que seja atribuído o rótulo ecológico aos produtos, e produto deve ser entendido como um bem ou um serviço, estes são submetidos a critérios ecológicos (tal como previsto no artigo 6.º do Regulamento (CE) n.º 66/2010), pelo que implicam a realização de estudos científicos para avaliar o impacto ambiental dos produtos relativamente a cada fase do seu ciclo de vida. Os critérios ecológicos para cada grupo de produtos são definidos de acordo com uma abordagem «do berço ao túmulo», o que quer dizer, que é feita uma análise do ciclo de vida dos produtos, identificando os efeitos destes no Ambiente, nas várias fases, começando na extracção das matérias-primas, de seguida o processo de transformação, passando pela distribuição e terminando na eliminação final do produto. Aquando da realização destes estudos, são aferidas muitas informações relevantes, nomeadamente sobre o consumo de energia, a poluição do ar assim como da água, a produção de resíduos, e ainda de uma forma adicional são tidos em conta critérios de desempenho.
Os produtos têm que passar o crivo da maioria qualificada dos Estados-Membros pela Comissão Europeia, sendo os critérios válidos por um período de dois a cinco anos, mas findo este prazo podem ser revistos e até mesmo reforçados de forma a garantir a melhoria do desempenho ambiental dos produtos que exibem o rótulo ecológico. O rótulo ecológico europeu é assim um símbolo de excelência ambiental sendo reconhecido em todos os Estados-Membros.
É de salientar que os rótulos ecológicos têm um carácter voluntário, o que significa que aos fabricantes cabe decidir fazer a candidatura ou não, desde que os seus produtos satisfaçam os critérios. Se optarem pela candidatura, e passarem a ostentar o rótulo ecológico podem comunicar aos seus clientes que os seus produtos são «amigos» do Ambiente, e contribuem para um desenvolvimento sustentável do meio Ambiente, também em termos económicos beneficiarão de uma vantagem competitiva. A fase final de todo este processo, passa pela identificação do produto através do logótipo de identificação, o que significa que uma vez atribuído o rótulo ecológico, todos os produtos ostentam o mesmo rótulo independentemente da sua origem. O logótipo de identificação consiste numa «flor». A selectividade é outra característica importante do rótulo ecológico na medida em que premeia os produtos que causem menos impacto ambiental relativamente aos produtos de um mesmo grupo.
 Foram adoptados pela União Europeia critérios ecológicos para efeito de atribuição do rótulo ecológico em relação a 24 grupo de produtos. Como decorre do Regulamento (CE) 66/2010, o rótulo ecológico contempla, na sua atribuição, os bens ou serviços que são destinados à sua distribuição, consumo ou utilização no mercado comunitário. Excluindo da sua aplicação os medicamentos destinados para uso humano, medicamentos veterinários assim como dispositivos médicos. Também ficam excluídos os produtos que contenham substâncias classificadas como tóxicas, perigosas para o meio ambiente, cancerígenas, mutagénicas ou substâncias químicas como previsto no Regulamento (CE) 1272/2008, de 16 de Dezembro de 2008.
A título de curiosidade, o primeiro hotel a receber o rótulo ecológico europeu foi o Hotel Jardim do Atlântico, localizado na Região Autónoma da Madeira, mais concretamente na zona da Calheta. A sua atribuição data 2004, visto que, o aldeamento turístico reunia um conjunto de características «amigas» do Ambiente. Para além de todos os critérios, rigorosos, científicos que são necessários para a atribuição do rótulo, o Hotel Jardim do Atlântico pauta-se pela ausência de ar condicionado, assim como uma ETAR própria que trata todos os efluentes líquidos, transformando-os e reaproveitando-os para rega dos jardins do hotel.
Como aspectos positivos do rótulo ecológico, é de salientar o papel importante da Comissão Europeia, pelos esforços que tem feito, na divulgação deste instituto. Criou um sítio na Internet onde dá formação aos proprietários de hotéis e parques de campismo sobre o rótulo ecológico. Por um simples registo no sítio disponibilizado na Internet os proprietários podem adquirir um conjunto de ferramentas importantes para se capacitarem de forma adquirir o rótulo ecológico.
Também os Estados-Membros no campo da contratação pública têm introduzido considerações ambientais. Tem-se entendido que os contratos públicos devem prosseguir o interesse público, mas ao mesmo tempo estimular a inovação social e promover uma utilização eficiente e sustentável dos fundos públicos, sendo evidente que as «entidades públicas, enquanto entidades adjudicantes, têm a obrigação de exercer o seu poder de compra de modo social e ambientalmente responsável», como refere Maria João Estorninho. O Tribunal de Justiça da União Europeia, no seu Acórdão Concordia Bus, de 2002 admitiu de uma forma expressa a admissão de critérios ambientais nos concursos públicos, argumentando que essa admissibilidade não entraria em choque com o princípio da não discriminação. No nosso Ordenamento Jurídico tem sido patente a preocupação em tornar os contratos públicos ecológicos, como é demonstrado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 65/2007, que aprovou a estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas, contudo esta ideia foi reforçada em 2011, como novas recomendações para uma nova estratégia.
Porém, considero que a grande fragilidade de que o rótulo ecológico padece encontra-se no campo das sanções. O Regulamento (CE) n.º 66/2010, no seu artigo 10.º n.º5, refere que o rótulo ecológico dos produtos que deixem de cumprir os critérios com base nos quais lhe foi conferido, deixa de ser utilizado. Porém, não nos diz qual seria a sanção aplicar quando os produtores tem uma actuação abusiva reincidente? O Regulamento apenas refere no seu artigo 17.º, que aos Estados-Membros é atribuída competência para elaborar sanções, exigindo a estes que as suas decisões sejam efectivas, proporcionais e dissuasivas. Na minha opinião são conceitos demasiado indeterminados, havendo a necessidade de serem concretizados.
Em suma,  considero que a iniciativa da União Europeia foi muito positiva, as vantagens são muitas e as fragilidades podem ser contornadas facilmente, para que no futuro não se tornem num problema efectivo. É de salientar que cada um de nós tem a responsabilidade de promover um desenvolvimento sustentável, temos que saber salvaguardar o nosso património comum de forma a legá-lo nas melhores condições, possíveis, às gerações futuras. Todas as desculpas que podem ser apresentadas para «fugir» a escolhas ambientalmente sustentáveis, são facilmente refutadas, porque somos indivíduos bem informados, com muitas competências adquiridas, desta forma temos, todos, que contribuir para a consciencialização dos problemas ambientais. Certo é, que o rótulo ecológico é uma ferramenta estritamente essencial para um desenvolvimento sustentável.
A nós, na posição de consumidores, devemos preferir produtos ambientalmente mais «amigos» do Ambiente, exercendo desta forma pressão sobre as empresas, para que estas melhorem os seus métodos de produção, incentivando a uma produção eficiente, inteligente e sobretudo sustentável. E de uma vez por todas, conformarmo-nos enquanto consumidores que a faceta verde do rótulo ecológico, assim como os seus benefícios, justificam os possíveis custos acrescidos na aquisição dos produtos.

  

                        


Bibliografia utilizada:
·         Gomes, Carla Amado, Introdução ao Direito do Ambiente, AAFDL, 2014.
·         Silva, Vasco Pereira da, Em busca do acto administrativo perdido, Almedina, 2003.
·         Silva, Vasco Pereira da, Verde Cor de Direito, Almedina, 2002.


Sítios da Internet:


        Andreia Barbosa da Silva
Aluna n.º 20493



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